Sou uma jovem esposa e mãe católica portuguesa. Neste blog partilho a minha caminhada em busca da santidade e o meu encontro com o amor misericordioso do Senhor. Espero que ele vos possa ajudar a encontrar a alegria do Evangelho!
Sou uma jovem esposa e mãe católica portuguesa. Neste blog partilho a minha caminhada em busca da santidade e o meu encontro com o amor misericordioso do Senhor. Espero que ele vos possa ajudar a encontrar a alegria do Evangelho!
Nestas férias, escolhemos um puzzle para montar em família. Um puzzle grande, com 1000 peças, com a pintura do "Julgamento Final" do Miguel Ângelo, e que me pôs bastante a pensar e meditar ...
A construção dum puzzle torna-se mais fácil se construirmos primeiro os seus limites. Limites são coisas boas, muito mais do que tendemos a pensar. Orientam-nos e dão-nos direções sobre onde cada desenho principal vai ficar. Dão-nos segurança, pois sabemos claramente até onde podemos ir, antes de nos engarnar-nos ou fazermos asneira. Limites claros e bem definidos permitem-nos começar a juntar peças e avançar na nossa construção. São esses mesmos limites, presentes desde o início, que, no final, garantirão que todo o puzzle se mantém unido, com cada peça no seu lugar ...
Avançamos no nosso trabalho e vamos à procura de novas peças, para as ligar àquelas que já temos colocadas corretamente nos seus devidos lugares. Tentamos e voltamos a tentar, até encontrar aquela peça perfeita que encaixa que nem uma luva. Encontramos, assim, o lugar que apenas aquela peça (e mais nenhuma outra) podia ter - não só pelo seu formato mas também pela harmonia das cores e pela continuidade do desenho.
Basta uma só peça não estar no seu devido lugar e o puzzle já não é o mesmo. Nota-se logo a sua falta. A sua beleza já não será completa ...
Ah, a beleza da jornada conjunta, lado a lado à volta da mesma mesa, de se ir construindo um puzzle peça por peça. A alegria partilhada por cada novo encaixe. A partilha da frustração por não se conseguir encontrar aquela peça que se procura há tanto tempo... "Deixa, dorme sobre o assunto, logo tentamos amanhã novamente, com as forças renovadas pelo Senhor "...
Nem todos os dias conseguiremos produzir os mesmos frutos: haverá dias em que montaremos pouco mais de meia dúzia de peças, mera gota de água naquele oceano; mas, noutros dias, veremos o quão abundantes podem ser os frutos do nosso trabalho, do nosso empenho e persistência...
Ah, o caminho partilhado... A obra que começa a tomar forma e relevo. "Força, estamos quase lá, juntos conseguimos" ...
Eis, por fim, o quadro final, sinal visível do nosso caminho conjunto, da nossa jornada partilhada. Todas as peças, por fim, perfeitamente unidas, a pintura finalmente composta. "Que linda está" ...
Continua a ver-se o formato individual de cada peça. Cada uma delas é única e não poderia ocupar nenhuma outro lugar ...
De hoje em diante, de cada vez que olharmos para aquele quadro, na parede da nossa casa, lembrar-nos-emos e faremos memória do caminho percorrido em conjunto. Contaremos histórias, partilharemos momentos e memórias ...
Assim acontecerá connosco, um dia, no Céu, quando Deus nos mostrar os puzzles das nossas vidas ... Oh, que pura beleza!
Esperar parece uma autêntica perda de tempo. Porquê esperar? Para quê? Não seria melhor se tudo acontecesse - já?! De que serve esperar?... Ai, o desejo impaciente de passar o mais rapidamente possível da situação em que me encontro para aquela que eu queria tanto estar ou ter ou fazer ou ser - e já!
Mas, se pensarmos bem, todos estamos permanentemente à espera. É raro, muito raro na verdade, não estarmos numa situação de espera - seja por algo ou por alguém. Às vezes, esperamos por coisas pequeninas, como esperar que nos respondam a um email, ficar preso no trânsito e nunca mais chegarmos onde queremos, estar na fila das compras (seja para entrar na loja ou para pagar), ou então esperar que chegue a hora de sair do trabalho ... Outras vezes, esperamos ansiosamente por coisas grandes e importantes, como saber que entrámos na faculdade dos nossos sonhos, discernir uma vocação, poder tomar o primeiro passo numa decisão importante ou esperar a resposta do outro ...
Há poucos dias atrás, iniciei um novo ano de vida, o meu 27º ano. Se Deus quiser, e por uma graça absolutamente imerecida, será durante o decorrer deste ano que poderei declarar o meu "sim", total e eterno, à vocação de amor a que o Senhor me chama. Apesar dos longos anos de discernimento vocacional, esperar pela vontade e pelo tempo de Deus continua a ser uma batalha perene para mim. Oh, como gostava que esse dia glorioso, em que poderei oferecer toda a minha vida e todo o meu ser, chegasse depressa - ou, melhor ainda, fosse já amanhã!
Mas, se Deus nos coloca, tantas vezes, em situações de espera, não seria melhor aprender a esperar e a esperar santamente?
A Bíblia está cheia de histórias de pessoas à espera. Às vezes, estão à espera de certas situações, outras vezes à espera umas das outras mas, principalmente, encontramos pessoas à espera de Deus.
Tomemos como exemplo as primeiras páginas dos Evangelhos. Zacarias e Isabel estão há anos à espera de ter um filho. Maria também espera o nascimento dum Filho, mas um que nunca pensara conceber. José está permanentemente à espera que Deus lhe diga o que deve fazer. Simeão e Ana passaram toda a sua vida à espera do dia em que veriam com os próprios olhos o Messias prometido.
Todo o Evangelho parece iniciar-se com pessoas à espera. O que inclui o próprio Deus - aliás, ninguém passou mais tempo à espera do que Ele que, desde a queda de Adão e Eva no Jardim do Éden, aguardava ardentemente o momento perfeito para revelar-Se e demonstrar todo o Seu amor e misericórdia por cada homem e mulher.
Mas, tanto Zacarias como Isabel, Maria e José, Simeão e Ana, souberam esperar santamente porque a sua espera estava fundada numa promessa e numa esperança firmes.
«Não temas, Zacarias: a tua súplica foi atendida. Isabel, tua esposa, vai dar-te um filho e tu vais chamar-lhe João.» (Lc 1,13)
«Maria, não temas, pois achaste graça diante de Deus. Hás-de conceber no teu seio e dar à luz um Filho, ao qual porás o nome de Jesus. Será grande e vai chamar-se Filho do Altíssimo» (Lc 1,30-31)
«José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que ela concebeu é obra do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, ao qual darás o nome de Jesus, porque Ele salvará o povo dos seus pecados.» (Mt 1,20-21)
Vivia em Jerusalém um homem chamado Simeão; era justo e piedoso e esperava a consolação de Israel. Tinha-lhe sido revelado pelo Espírito Santo que não morreria antes de ter visto o Messias do Senhor. (Lc 2,25-26)
Zacarias, Isabel e Maria a admirarem João, o filho prometido pelo anjo do Senhor - Imagem retirada daqui
É a fé nas promessas do Senhor que permite a cada uma destas pessoas saber esperar santamente. Pela fé, acreditam desde já que possuirão, um dia, aquilo que o próprio Senhor lhes prometeu. Elas escolheram aceitar receber e aceitar acreditar nas promessas do Senhor. E, assim, aquilo que, a nós, nos parece futuro, para elas tornam-se, desde já, presente e real; torna-se, desde já, obtido.
É como se recebessem uma semente da parte do Senhor, que crescerá e brotará na terra fértil da sua fé. São capazes de sorrir a cada novo amanhã (como é dito da mulher forte em Provérbios 31) porque sabem que, neste preciso momento em que vivem, a promessa de Deus está a ganhar forma, está a crescer, está a realizar-se. O segredo de esperar santamente é, assim, a fé de que Deus já plantou a semente, que algo já começou, de que algo está já a ocorrer.
Esse algo está, quase sempre, escondido aos nossos olhos, sim; mas nem por isso deixa de acontecer ou ser real, porque, como nos disse Jesus: "O Meu Pai está sempre a trabalhar" (Jo 5,17)
Olhemos uma vez mais para os Evangelhos, mas agora para as últimas páginas, para a paixão e ressurreição de Jesus. Uma das palavras mais usadas para descrever o que aconteceu a Jesus é "ser entregue".
Estando reunidos na Galileia, Jesus disse-lhes: «O Filho do Homem tem de ser entregue nas mãos dos homens, que o matarão; mas, ao terceiro dia, ressuscitará.» (Mt 22,22-23)
Então, Judas Iscariotes, um dos Doze, foi ter com os sumos sacerdotes para lhes entregar Jesus. Eles ouviram-no com satisfação e prometeram dar-lhe dinheiro. E Judas espreitava ocasião favorável para O entregar. (Mc 14,10-11)
Quando chegou a hora, pôs-Se à mesa e os Apóstolos com Ele. Tomou, então, o pão e, depois de dar graças, partiu-o e distribuiu-o por eles, dizendo: «Isto é o Meu corpo, que vai ser entregue por vós; fazei isto em memória de Mim.» (Lc 22,19)
Estas mesmas palavras serão depois usada por São Paulo, na sua carta aos Romanos, ao declarar que "[Deus] nem sequer poupou o seu próprio Filho, mas entregou-O por todos nós" (Rom 8,32)
É impressionante reparar como, logo a seguir a ser entregue às autoridades de Jerusalém, Jesus deixa de ser Aquele que faz e submete-se humildemente a ser Aquele a quem as coisas Lhe são feitas ... Jesus é preso por outros; é levado até ao Sumo-Sacerdote; depois é levado até Pilatos; é coroado com espinhos e, por fim, preso na cruz. Tudo Lhe é feito, sem que Ele tenha qualquer controlo.
Quando Jesus finalmente diz: "Tudo está consumado" (Jo 19,30), Ele não quer dizer "Eu fiz todas as coisas que queria fazer", mas sim "Eu permiti que Me fosse feito tudo o que era preciso, de modo a cumprir plenamente a Minha vocação." Na verdade, Jesus não cumpriu a Sua missão apenas de uma forma activa, ou seja, curando os doentes, fazendo milagres, anunciando o Reino de Deus; mas também de uma forma passiva (muitíssimo mais difícil de aceitar que aconteça, na minha opinião!) durante a sua longa Paixão, sabendo esperar santamente a realização do plano de Deus Pai.
Assim, de certa forma, a agonia de Jesus não será meramente a agonia da morte e do sofrimento, mas também a agonia de ter de esperar. É a agonia dum Deus que depende de nós para poder demonstrar a Sua divina presença entre nós; é a agonia dum Deus que, duma forma absolutamente misteriosa, permite-nos quase que decidir como Deus será Deus...
Descubro, assim, uma nova perspectiva de esperar - não apenas em esperar por Deus, mas também de participar na espera do próprio Deus ...
O Templo de Deus abriu-se no Céu e a Arca da Aliança foi vista no seu Templo. Apareceu no céu um sinal grandioso: uma mulher revestida de sol, com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas na cabeça. (Ap 11,19a; 12,1)
É com este relato que se inicia hoje as leituras da Santa Missa, dia da Assunção de Nossa Senhora. Não sei se têm bem noção da natureza estrondosa, absolutamente chocante, desta afirmação do Apóstolo João: "a Arca da Aliança foi vista no seu Templo".
Na altura em que este relato foi escrito, a Arca da Aliança tinha sido vista pela última vez já há mais de 500 anos atrás. Por altura do exílio do povo judeu na Babilónia, o profeta Jeremias, inspirado pelo Senhor, tinha-a escondido numa gruta algures no Monte Sinai, para não mais voltar a ser encontrada "até que Deus reúna o seu povo e use com ele de misericórdia" (2 Mac 2,7)
Esta promessa, nunca esquecida pelo povo judeu por mais anos que passassem, realizou-se nesta visão do Apóstolo S. João. Eis a nova Arca da Aliança - Maria, mãe de Jesus, o Salvador.
A antiga Arca da Aliança era revestida a ouro. A nova Arca, Maria, está "revestida de sol" como nos diz São João e como nos confirmam os Pastorinhos de Fátima dizendo que "era uma Senhora mais brilhante que o sol" .
A antiga Arca continha o cajado florido de Aarão, o primeiro sumo-sacerdote instituído pelo Senhor, enquanto o ventre de Maria contém dentro de si o Sumo-Sacerdote eterno.
A antiga Arca continha as tábuas com os 10 Mandamentos da Lei de Deus, que tinham sido escritas pelo próprio dedo do Senhor. Maria, a nova Arca, contém Jesus dentro de si, o Verbo de Deus.
Por fim, a antiga Arca continha o maná, o alimento vindo do céu durante os 40 anos da travessia do deserto do povo hebreu. A nova Arca, Maria, contém o Pão Vivo, descido dos Céus, o verdadeiro alimento que nos dá a vida eterna.
[A mulher] estava para ser mãe e gritava com as dores e ânsias da maternidade. (Ap 12,2)
Com esta simples frase, o Apóstolo João confirma-nos aquilo que é dogma de Fé: no final da sua vida terrena, Maria foi levada, em corpo e em alma, para junto de Deus. Em parte, como primícias de toda a Igreja, como antecipação daquilo que acreditamos que nos acontecerá no Último Dia. Mas, por outro lado, Maria foi assupta aos Céus, ou seja, foi assumida por Deus, como culminar de toda a sua vivência terrena: Maria passou toda a sua vida a conformar a sua vontade com a do Senhor, mais perfeitamente a cada novo dia, de tal modo que, por altura da sua morte, era absolutamente impossível distinguir ou separar o coração de Maria com o coração de Deus...
Peçamos a Maria, neste dia tão especial, que nos ensine e ajude a conformar o nosso próprio coração, sempre tão rebelde e orgulhoso, com o coração e a vontade de Deus. Amén
Continuamos na maré de reflexões feitas durante as noites de insónia ...
O Senhor Deus formou o homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida, e o homem transformou-se num ser vivo. O Senhor Deus levou o homem e colocou-o no jardim do Éden, para o cultivar e, também, para o guardar. O homem designou com nomes todos os animais domésticos, todas as aves dos céus e todos os animais ferozes; contudo, não encontrou auxiliar semelhante a ele.
Então, o Senhor Deus fez cair sobre o homem um sono profundo; e, enquanto ele dormia, tirou-lhe uma das suas costelas, cujo lugar preencheu de carne.Da costela que retirara do homem, o Senhor Deus fez a mulher e conduziu-a até ao homem. (Gn 2,7.15.20-22)
Costumava pensar em como deveria ser fácil e simples a vida no jardim do Éden. Oh, como seria bom voltar para lá, se fosse possível ... Quanto mais amadureço e mais vezes leio este relato, mais me vou apercebendo de que essa facilidade, afinal, não aparece escrita (nem implícita) em lado nenhum ...
Na história do primeiro casal da humanidade, vemos claramente como cada um recebeu o outro das próprias mãos de Deus. Não foi por conquista, nem por procura, nem por qualquer mérito próprio. O dom da vida do outro foi puro dom imerecido, dado por pura bondade pelo Deus-Amor.
Aliás, se lermos com atenção todo o relato da Criação, apercebemo-nos que tudo, absolutamente tudo - desde os animais, aos alimentos, até ao amor do cônjuge - é dado na forma de esperança e de dom de Deus. A lição diária da vida no jardim do Éden parece ser o aprender, dia após dia, a tudo receber das mãos de Deus ...
Adão é chamado a dominar o mundo, não para o destruir; mas para dele fazer brotar a vida, a cada novo instante, protegendo-a, conservando-a, guardando-a de todos os perigos ...
Adão foi feito à imagem de Deus, sim. Mas, sozinho, nunca se poderia tornar Seu semelhante, como era o desejo mais profundo que Deus tinha semeado no seu coração, desde o primeiro momento de vida. Adão pressentia esta realidade, mesmo sem a conhecer na totalidade, e por isso sentia-se profundamente insatisfeito e incompleto. Porque, para tornar-nos semelhantes a Deus, temos de nos tornar semelhantes à Santíssima Trindade, pura comunhão de Amor.
Assim, Adão adormece e deixa que Deus realize este seu desejo mais profundo. Coloca-se, uma vez mais, nas mãos de Deus. Adão adormece na expectativa e na esperança de que o Deus-Amor - que ele tinha vindo a conhecer e amar a cada novo passeio pela brisa da tarde - seria capaz de cumprir perfeitamente esse desejo de completude do seu coração - como só o melhor dos Pais e o mais perfeito dos Criadores o poderia fazer.
E é sob esta confiança e este abandono à vontade Divina, da parte de Adão, que Deus vai moldar, dando um corpo e espírito, àquela que corresponderá ao coração de Adão. É mais uma ternura da parte de Deus, dar ao homem a alegria de ser atendidona oração...
Finalmente, homem e mulher, unidos num só corpo e espírito, amando-se de tal forma que o seu amor transborda e transmite-se, ao ponto de ser capaz de gerar nova vida - tornando-se uma família - essa é a imagem e semelhança mais perfeita de Deus, Santíssima Trindade.
A serpente retorquiu à mulher: «Não, não morrereis;porque Deus sabe que, no dia em que o comerdes, abrir-se-ão os vossos olhos e sereis como Deus, ficareis a conhecer o bem e o mal». Vendo a mulher que o fruto da árvore devia ser bom para comer, pois era de atraente aspecto e precioso para esclarecer a inteligência, agarrou do fruto, comeu, deu dele também a seu marido, que estava junto dela, e ele também comeu. (Gn 3,4-6)
É impressionante apercebermo-nos de como a tentação, trazida pela serpente, vem exactamente na direcção deste desejo profundo (e justo!) que Adão e Eva têm de se realizarem numa semelhança cada vez mais perfeita com Deus ...
Contudo, ao contrário do acto de puro abandono de Adão nas mãos de Deus, Eva cede à tentação de procurar cumprir este desejo por sua própria iniciativa. Ao contrário de Adão, que se abandona à vontade Divina, Eva cede à tentação da cobiça. Enquanto Adão tinha demonstrado que estava disposto a esperar pelo tempo do Senhor - quem saberia se ainda demoraria dias, meses, anos ou décadas! - até que o seu desejo fosse cumprido, Eva cede à tentação de querer adquirir, imediatamente, a realização da promessa sibilada pela serpente ...
Eis o balanço da tragédia: o desejo original, puro e bem ordenado, que atraía mutuamente o homem e a mulher, e tanto um como o outro para a sua realização na semelhança perfeita com o Deus-Amor, alterou-se - de forma, aparentemente, irremediável...
Este desejo de semelhança com Deus, no homem, tornou-se em vontade de domínio e de posse sobre o outro - em vez de o acarinhar e proteger como dom de Deus. Na mulher, transformou-se em cobiça jamais saciada e numa atitude de insatisfação perene - em vez do acolhimento e nutrimento a que era inicialmente chamada ...
E pensar que Jesus, na Sua humanidade, e através da nova mulher, Maria, veio não só redimir e reparar o pecado cometido - por mim, por ti, todos os dias da nossa vida - mas também libertar-nos dele e das suas garras, e assim salvar-nos - para sempre! Sempre!
Tenho andado a passar por um período de insónias e, assim, a Bíblia tem-me acompanhado ainda mais do que o costume. Nestes dias, a Igreja tem-nos levado a meditar em diversas parábolas de Jesus, transmitidas até aos dias de hoje através do Evangelho segundo São Mateus.
Afastando-se, então, das multidões, Jesus foi para casa. E os seus discípulos, aproximando-se Dele, disseram-Lhe: «Explica-nos a parábola do joio no campo.» (Mt 13,36)
Também eu, na solidão do meu quarto, longe das confusões e preocupações que me enchem os dias, me tento aproximar de Jesus, pedindo-Lhe incessantemente: Senhor, explica-me ...
«O Reino do Céu é comparável a um homem que semeou boa semente no seu campo. Ora, enquanto os seus homens dormiam, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo e afastou-se.Quando a haste cresceu e deu fruto, apareceu também o joio.
Os servos do dono da casa foram ter com ele e disseram-lhe: 'Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio?'
'Foi algum inimigo meu que fez isto' - respondeu ele.
Disseram-lhe os servos: 'Queres que vamos arrancá-lo?'
Ele respondeu: 'Não, para que não suceda que, ao apanhardes o joio, arranqueis o trigo ao mesmo tempo.Deixai um e outro crescer juntos, até à ceifa; e, na altura da ceifa, direi aos ceifeiros: Apanhai primeiro o joio e atai-o em feixes para ser queimado; e recolhei o trigo no meu celeiro.'» (Mt 13, 24-30)
Estarei eu atenta aquilo que vai crescendo dentro de mim, no campo que o Senhor semeou, no meu coração, na minha vida?
As sementes do Senhor são abundantes e numerosas. Como é que eu as tenho recebido? Como as tenho nutrido? Estarei a ter o cuidado de continuamente enriquecer o solo do meu campo, com a virtude da humildade (que tem origem na palavra "humus" - solo), ou estarei eu a deixar que ele se endureça de orgulho?
Que tipo de sementes tenho eu permitido que criem raízes em mim? Sementes geradoras de vida, de trigo frutuoso, de trigo que se deixe arrancar e moer, para assim se tornar farinha e depois pão, a fim de dar vida aqueles que me rodeiam? Ou serão sementes ocas e vazias, que apenas ocupam espaço e tempo, impedindo que as boas sementes cresçam e se desenvolvam em pleno esplendor?
Contudo, é necessário aprender a esperar pelo tempo certo do Senhor. Se me deparar com algo que me pareça joio na minha vida, posso, num acto colérico, querer arrancá-lo imediatamente e assim tratar do assunto (à minha maneira, claro). Mas a verdade é que eu percebo pouco de "agricultura" ... saberei eu distinguir, realmente, o trigo do joio? Não, o Senhor não deseja que nenhum trigo se perca ou seja arrancado precocemente; e eu sei, por experiência, que percebo muito pouco de "agricultura" ... Na minha ânsia, posso estar a arrancar de forma irremediável algo que, na verdade, seja bom e traga o bem. É preciso ter paciência e esperar pela ordem interior que o Senhor nos dá - "Sim, é agora, é isso mesmo" ou "Não, ainda não, espera Marisa ...".
Pior ainda - posso cair na tentação de querer ir arrancar aquilo que me parece joio na vida do outro que me rodeia. Deixa-me que "te ajude", penso eu. Ah, que tentação frequente ... Não, apenas ao Senhor, e unicamente a Ele, pertence a ceifa e a colheita ...