Sou uma jovem esposa e mãe católica portuguesa. Neste blog partilho a minha caminhada em busca da santidade e o meu encontro com o amor misericordioso do Senhor. Espero que ele vos possa ajudar a encontrar a alegria do Evangelho!
Sou uma jovem esposa e mãe católica portuguesa. Neste blog partilho a minha caminhada em busca da santidade e o meu encontro com o amor misericordioso do Senhor. Espero que ele vos possa ajudar a encontrar a alegria do Evangelho!
Só o Evangelho segundo S. Lucas nos fala sobre a profetisa Ana. Ana tende a passar tão despercebida entre as linhas do Evangelho como também deve ter passado despercebida ao longo da sua própria vida. À semelhança de Nossa Senhora, também a vida de Ana sofreu uma grande e inesperada reviravolta quando, tragicamente, perdeu o seu amado marido, sendo ainda muito nova, após um feliz mas dolorosamente curto matrimónio. Imagino-a a pensar: E agora, o que devo fazer? Sem filhos e sem família ... Quem cuidará de mim? Quem me protegerá? Quem me amará?
Ao reflectir sobre o início da Quaresma deste ano, dei por mim a pensar no exemplo da profetisa Ana, que nos é dada a conhecer no relato da apresentação de Jesus Menino no Templo de Jerusalém. Ana tende a passar tão despercebida entre as linhas do Evangelho como também deve ter passado despercebida ao longo da sua própria vida. Ao rezar os Mistérios Gozosos do Terço, quantas vezes dou por mim a pensar mais em Simeão e nas suas palavras do que nas de Ana?...
"Quando se cumpriu o tempo da sua purificação, segundo a Lei de Moisés, levaram o Menino a Jerusalém para O apresentarem ao Senhor. Havia uma profetisa, Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser, a qual era de idade muito avançada. Depois de ter vivido casada sete anos, após o seu tempo de donzela, ficou viúva até aos oitenta e quatro anos". (Lc 2, 22.36-37)
À semelhança de Nossa Senhora, também a vida de Ana sofreu uma grande e inesperada reviravolta quando, tragicamente, Ana perdeu o seu amado marido, sendo ainda muito nova, após um feliz mas dolorosamente curto matrimónio. Ana terá certamente pensado: E agora, o que devo fazer? Sem filhos e sem família ... Quem cuidará de mim? Quem me protegerá? Quem me amará?
Ana, à semelhança da história do povo hebreu e à semelhança de cada um de nós em alguma altura das nossas vidas, teve de descobrir o amor carinhoso, o cuidado atencioso, a protecção segura, a firmeza da presença permanente e inabalável do Deus que nunca nos abandona e que nos acompanha em todos os instantes da nossa vida. Pela fé, Ana permitiu que Deus transformasse um acontecimento trágico, que poderia tê-la destruído interiormente, em algo belo e frutuoso - uma vida dedicada ao serviço dos irmãos e à oração pela vinda do Messias prometido, que viria resgatar para sempre todo o povo de Israel.
Talvez por o Evangelho nos falar do seu "tempo de donzela", eu tendo a imaginar Ana como uma daquelas mulheres que desenvolvem uma beleza tão única e especial, que não parece mudar com o avançar dos anos. Aquele tipo de beleza que só é possível ser desenvolvida por quem se deixa preencher, cativar e florescer pelas graças do Senhor, numa contínua relação de intimidade de amor mútuo com Deus. Imagino Ana com um espírito jovem e vivo, típico de quem aprende a falar com o Senhor como com um amigo, mas, simultaneamente, com uma alma firmemente enraizada no profundo amor e bondade do Senhor, demonstrado e comprovado em todos os dias da sua longa vida.
Pintura da Profetisa Ana, da autoria da maravilhosa artista protestante Elspeth Young
Ana viveu e serviu no Templo de Jerusalém durante várias décadas, após ter ficado viúva, o que lhe terá permitido ouvir repetidamente as palavras divinas da Lei e dos Profetas, as inúmeras discussões e ensinamentos dos escribas e dos fariseus, assim como observar todos os movimentos, carregados de significado e simbolismo, dos sacerdotes do Templo. Assim, Ana estaria bem familiarizada com as diversas profecias dos autores sagrados que anunciavam a vinda do Messias. Isto, associado ao cuidado amadurecimento do seu génio feminino e a uma graça especial do Senhor, fizeram dela uma das poucas profetisas nomeadas nas Sagradas Escrituras, à semelhança de Miriam, irmã de Moisés, e de Débora no Antigo Testamento. Uma profetisa é alguém que sabe interpretar os sinais dos tempos e de discernir a vontade de Deus, tal como ela o fez, de forma aparentemente tão simples, no relato da apresentação de Jesus no Templo - um acontecimento de tal forma importante que foi imortalizado para sempre, primeiro na Tradição da Igreja, depois nas páginas da Bíblia e depois ainda nos Mistérios do Santo Terço.
[Ana] não se afastava do Templo, participando no culto noite e dia, com jejuns e orações. (Lc 2,38)
A sua presença constante no Templo, contudo, também lhe daria hipóteses de observar atentamente o comportamento dos fariseus legalistas, o domínio crescente dos vendedores, comerciantes e cambistas, assim como todas as demonstrações de hipocrisia, desrespeito e pecado, realizadas na Casa do Senhor, aquela que devia ser "casa de oração" por excelência, e não um "covil de ladrões" como se tinha tornado (cf Mt 21,13). Questiono-me se alguma vez lhe terá passado pela cabeça fazer algo parecido ao que Jesus faria, anos mais tarde, expulsando "os que vendiam e os que compravam" e "derrubando as mesas" onde se propagava a iniquidade daquele povo? (cf Mt 21,12) Quem sabe ...
Ana é um belo exemplo de paciência, de quem sabe esperar fielmente pelo cumprimento das promessas do Senhor. Mas, ao contrário do que o mundo nos diz, esperar no Senhor e esperar pelo cumprimento das Suas promessas, não tem nada de passivo. Ana participava na vida e nas celebrações do Templo de Jerusalém, servindo o Senhor e os irmãos e dedicando-lhes toda a sua vida. Ana era activa na sua espera, jejuando e orando frequentemente. Quem já jejuou sabe que é algo que tem pouco de passivo, é necessário uma luta interior, permanente, contra o desejo natural de saciar o nosso corpo com comida.
Ana ter-se-á dedicado a preparar-se, à semelhança das virgens prudentes (cf Mt 25,1-13), para a vinda do Messias desejado. Ana é um exemplo perfeito de quem conseguiu manter acesa dentro de si a chama da esperança, da fé nas promessas feitas pelo Deus fiel, apesar das dificuldades e das situações que a poderiam desanimar e enfraquecer. Assim, ela esperou e esperou e esperou. Atenta e vigilante aos sinais dos tempos e do Senhor. Com fé viva e expectante - durante 84 anos.
Se Ana "não se afastava do Templo, participando no culto de noite e de dia", quem sabe se ela não terá também testemunhado os acontecimentos extraordinários que envolveram o sacerdote Zacarias no ano anterior? (cf Lc 1,5-25)
Talvez também ela terá reparado em como Zacarias se demorava no interior do Santo dos Santos. Talvez também ela terá esperado que ele de lá saísse, expectante acerca do que poderia estar a acontecer. Talvez também ela terá ficado admirada por descobrir que Zacarias "não lhes podia falar", que tinha ficado "mudo" e que só era capaz de comunicar por "sinais" a partir desse dia. Talvez também ela terá compreendido que Zacarias "tinha tido uma visão no santuário" que mudaria, não só a sua vida, mas a de toda a História. Talvez também ela terá estado presente no Templo quando, 9 meses mais tarde, a boca de Zacarias "abriu-se, a língua desprendeu-se-lhe e começou a falar, bendizendo a Deus" (Lc 1,64), após o nascimento do seu filho João. Quem sabe?
Na verdade, Lucas diz-nos realmente que "por toda a montanha da Judeia se divulgaram aqueles factos" (Lc 1,65) e que "quantos os ouviam retinham-nos na memória e diziam para si próprios: «Quem virá a ser este menino?»" (Lc 1,66). Assim, talvez também Ana terá meditado no seu coração, à semelhança da Virgem Maria, acerca do profundo significado e das implicações de tais acontecimentos extraordinários, o que a terá colocado ainda mais atenta e vigilante na leitura e interpretação dos sinais que o Senhor dava ao seu povo amado. Afinal, não tinha cantado Zacarias que João seria "chamado profeta do Altíssimo, porque [iria] à Sua frente a preparar os Seus caminhos" (Lc 1,76) e que "o Senhor, Deus de Israel, [tinha] visitado e redimido o Seu povo, [dando-nos] um Salvador poderoso da casa de David, Seu servo"? (Lc 1,68-29)
Será que o tempo favorável tinha chegado? Será que o acontecimento mais desejado da história do povo hebreu, a vinda do Messias, o resgate de Israel, estava finalmente a acontecer, ali mesmo, à frente dos seus olhos?
Por esta altura, já era difícil esconder o sorriso aberto e inexplicável na bela face de Ana, que parecia tornar-se ainda mais bela e jovem a cada novo dia de esperança renovada. Já nem lhe passava pela cabeça abandonar, por um segundo que seja, o Templo de Jerusalém, para ir dormir e descansar na sua casa. O Senhor estava perto, era preciso orar e preparar-se para O receber.
E quanto não terá exultado de alegria, meses mais tarde, ao ouvir o testemunho dos pastores de Belém que "começaram a divulgar o que [os Anjos] lhes tinham dito a respeito daquele Menino", fazendo com que "todos os que os ouviam se admirassem"? (Lc 2,17-18). Oh sim, Ana terá certamente vivido na mais pura alegria durante os 40 dias que ainda teve de esperar até conhecer o desejado Redentor de Israel.
Assim, quando José e Maria vieram ao Templo para oferecerem o Menino ao Senhor, ela ali estava, preparada e à espera, radiante e rejubilante, junto de Simeão.
"[Ana] aparecendo nessa mesma ocasião, pôs-se a louvar a Deus e a falar do Menino a todos os que esperavam a redenção de Jerusalém". (Lc 2,38)
Sempre achei muito engraçado que Lucas nos dissesse que, após o seu encontro com o Senhor Encarnado, Ana "pôs-se ... a falar do Menino a todos". Ora aí está Deus a fazer um bom uso duma característica tendencialmente feminina: ir contar a toda a gente algo que aconteceu! Faz-me lembrar do dia da Ressurreição do Senhor, em que Maria Madalena e as outras mulheres "cheias de temor e de grande alegria, correram a dar a notícia aos discípulos" (Mt 28, 8b), dando assim um santo uso a esta capacidade feminina de propagar e partilhar um acontecimento ...
Esta semana começa a Quaresma, o tempo por excelência para nos preparar-mos para receber o amor do Senhor, que é tão grande e imenso que precisa de espaço - nas nossas vidas mas especialmente dentro de nós. Aprendamos o que é viver em clima de preparação constante e vigilantes. Deixemo-nos inspirar no exemplo da profetisa Ana, sejamos activos na nossa espera e tenhamos os olhos e o coração abertos às palavras e aos sinais do Senhor. Desejo-vos uma Santa e abençoada Quaresma!